Somos todos diferentes. Diferentes traços genéticos nos definem feições, pesos e alturas diversos – um mosaico humano. Nossos talentos são diversos: uns são sensíveis às artes, outros hábeis com as mãos – ou raciocinam de maneira abstrata, desafiando os limites do universo. Somos gregários ou reservados, espirituais ou pragmáticos, ou qualquer posição nesses espectros entre o claro e o escuro.
Atirados no nascimento a um mundo que gira a 1660km/h – numa cultura que começou muito antes de chegarmos, somos esponjas a tentar entender nosso entorno. Desenvolvemos linguagem, habilidades motoras, preferências – e vamos assim plantando os alicerces para nos sentirmos seguros para nossas decisões e ações – um mosaico ideológico.
É desses alicerces que derivamos nossa visão de mundo, que construímos nossas certezas. Não há interpretação que façamos sem o filtro de nossas internalizadas ideologias. Essas certezas construídas são tão diversas quanto nossos modos de ser, mas nos aglutinamos em torno daqueles que se parecem conosco, e passamos a nos sentir parte de um todo.
Os coletivos pensam pelos indivíduos – o que também parece ser típico de nossa espécie – e formam-se estruturas de poder. Capazes de proteger seus “iguais”, essas estruturas se impõe a outras, arrebanham fiéis, elegem adversários. Surgem as agremiações, as religiões, os partidos políticos. Haverá nas ideologias vários alertas sobre as tentativas dos outros grupos em abalar “a única Verdade”.A esta altura, o indivíduo diluído que ousar questionar seu coletivo sofrerá sanções.
A luta de uma sociedade por suas verdades leva a extremos, como nos mostra a jornalista Barbara Demick, no livro “NADA A INVEJAR, Vidas Comuns na Coreia do Norte”, que coletou relatos chocantes de pessoas que fugiram daquele país. As ideias socialistas se associaram ao confucionismo e a outros elementos culturais da península, resultando num regime político socialista e hereditário. O Partido dos Trabalhadores coreano representa os organizadores do regime, que coordena todos os meios de produção, estabelece leis e escolhe como fazê-las cumprir.
Entre a china e a Coreia do Sul, a noite sem eletricidade da Coreia do norte |
Com a abertura das economias chinesa e soviética a práticas capitalistas, a Coreia do Norte perde apoios. Sua dedicação a um programa nuclear complementam as justificativas para um embargo, relegando à miséria seus mais de 23 milhões de habitantes. Ajuda humanitária tenta prover comida, mas pessoas com mais influência utilizam seu poder para disputar os escassos recursos. E há sempre gente disposta a defender regimes totalitários dos quais seus habitantes arriscam a vida para fugir.
Se pudéssemos alternar diferentes ângulos de visão ou sacudir esses mosaicos ideológicos às exigências da realidade, passaríamos de estruturas fixas a caleidoscópios, com maior diversidade. Nas múltiplas possibilidades, poderíamos buscar as alternativas mais ajustáveis a cada momento, livres de certezas construídas no passado de ideologias extremadas. Para isto, é preciso a coragem de deixar certezas para trás, expor-se a novos grupos e novos arranjos de ideias, enriquecendo nosso senso crítico. Estaríamos assim mais aptos a vencer a fome de alimento, cultura, planejamento e respeito mútuo em que nos colocamos.