quinta-feira, 20 de novembro de 2014

Coisas que Encontro dentro dos livros

*Publicado originalmente no blog DOSE LITERÁRIA

A maioria dos livros que leio não são novos. Emprestados da biblioteca da família, indicações da irmã ou de um amigo, exemplares comprados em sebos. Um dos charmes de ler livros usados é encontrar as marcas das leituras anteriores.


Por que aquele trecho foi grifado? Eu daria tanta atenção a esta frase? Qual o motivo de uma orelha dobrada, uma página marcada? Quanto custava o livro? Em Cruzeiros? Cruzados novos?

Quando não se tem um marcador à mão, serve qualquer artifício. Uma nota fiscal na versão moderna, daquelas que saem das maquininhas de cartão. Uma nota fiscal das antigas, escritas à mão. Um bilhete, uma reflexão, uma anotação no canto da página. 

Os leitores vão deixando marcas. As épocas também. Já encontrei anotações minhas, de leituras prévias, que não tinham mais o menor sentido. Aparentemente minhas ideias amarelam como as folhas dos livros. Ainda bem que ainda posso acrescentar novos capítulos, ou reeditar minhas melhores versões.

Uma vez, ao embarcar no avião, havia um livro em francês, esquecido no bolsão à frente. Folheei-o rapidamente, e tive tempo de fantasiar um jeito de divulgar nas redes sociais (versão moderna das mensagens na garrafa), na tentativa de encontrar seu dono. Próximo à contracapa uma foto. Pessoa bonita, bem vestida. Seria o dono? Seria um amigo especial? Bem pesado, minhas chances eram remotas, e preferi avisar a comissária. Ela me disse que tentariam pegar o distraído ainda no desembarque. 



Será que conseguiram?

quinta-feira, 13 de novembro de 2014

Dias de Verão - Sônia Rodrigues

Uma das coisas bacanas da democracia, que parece esquecida em função da recente tensão eleitoral, é que podemos discordar e permanecer amigos. Nem sempre nosso argumento toca o outro. Quem disse que estamos sempre certos?

Meu primeiro contato com a autora de "Dias de Verão" foi pelo skoob. Ela discordou de maneira elegante e argumentativa de meus comentários sobre "Mentes Inquietas", também publicadas no Dose Literária. Repliquei mantendo minha posição, que nem era diametralmente oposta à dela, e fui fuçar seu perfil. Leitora experiente, me interessou, e propus segui-la. Um tempo depois, ela me contatou, pesquisando quais leitores eletrônicos eu utilizava. Admiti minha completa ignorância no tema, e ela me presenteou com um de seus livros, em formato PDF. 

Dias de Verão é uma coletânea de contos curtos, de leitura muito fácil e agradável. Em seu estilo despretensioso, Sonia não esconde suas muitas leituras, e um jeito de viver intenso, de quem se debate para extrair o suco da vida.

Não é gostoso quando nos identificamos com as ideias de um autor? Parece que mais alguém nos entende. Descobri inúmeras afinidades: o apreço pelo frio e pelo silêncio, o fascínio por relógios, o interesse pelo budismo. A qualidade relativa da vida no interior.

A vida é busca incessante, por vezes dolorosa. Nós leitores temos este pequeno segredo. Ler e escrever passa a ser um prazer e mais que isso, uma necessidade:

" Em uma carta, a alma esparrama-se como um gato em um tapete macio".

Procuramos nos livros essa companhia especial - que só se acha na afinidade de ideias. Sei que a cultura e sede de vida demostrada pela autora pode assustar os incautos. Pessoas com tanto a dividir podem ser intimidantes, e fazerem sua vida um tanto solitária. 

Sonia, esta é uma carta para você. Meu desejo após esta "degustação" de sua escrita é que você tenha muitos leitores e amigos para dividir suas percepções do mundo, e que não perca nenhuma oportunidade de regar essas reuniões com bom vinho.